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Quando uma guerra se instaura a fragilidade da moral se apresenta como questão, pois caem por terra as falsas seguranças dos imperativos: “isso pode, aquilo não”.
“Isso pode, aquilo não” representa o pacto implícito sem o qual a vida em sociedade seria impossível. Mas, convém recordar, no jogo dos laços sociais toda carta é marcada, potencialmente violenta, já que até mesmo o silêncio tem o risco de parecer, ou mesmo ser, ofensivo.
Leis e ordens não são suficientes para conter esta realidade que nos atravessa – cartas marcadas – e seguimos entre a calmaria a tempestade, entre a graça e o mal estar, entre o correto e a transgressão.
A ética vem então em nosso socorro, nunca como uma prescrição, mas como um limiar. Como as linhas imaginárias que separam as nações, a ética estabelece a fronteira entre o que é meu e o território sagrado do outro.
Cartas marcadas, um passo a mais e lá estamos nós a invadir esse território alheio, usurpando-lhe assim sua dignidade. Será violento quem se defende?
Penso que nestas horas em que o pacto civilizatório é quebrado, a lucidez não consista em apontar quem bateu primeiro, mas em saber que são tênues as linhas da divisa. Por vezes será preciso, sim, um pulso firme para restabelece-las, não para revidar, mas para tornar novamente evidente os limites da sacralidade e da dignidade usurpada.
Psicanalista, mestre em filosofia e em teologia. Celebrante social. (mais)
